
Conheci "Paizão" em Irajá (RJ) - ao menos o que sobrou dele. Paizão deve ter uns 60 anos, mais ou menos. Difícil precisar em alguns poucos contatos. Assim mesmo, naquilo que meu olhar permite avaliar, pela minha experiência de rua e uso, não se parecia com nada daquilo que a sociedade, os "formadores" de opinião, a mídia e os especialistas o consideram. O velho Paizão era ágil nos seus movimentos, postura correta, a despeito da aparência zuada prejudicada pela rua e o vicio. Articulado, desenrolava bem as ideias comigo e os demais, sobretudo, com os meninos do movimento. Humilde, direto, bem humorado, leve, esclarecido e consciente sobre a rua e o crime. Paizão flana pelas vielas do Irajá, entre pistolas, sacolas, fuzis, transeuntes - moradores, viciados, traficantes. O movimento é constante e não para!
Paiakan ainda não deve ter 30. Perambula pelos becos da Vila de Ponta de Negra (RN). Figura conhecida da comunidade. Desenrola com todos - viciados, estrangeiros, visitantes, traficantes, moradores. Faz um avião aqui, um corre ali, um bico acolá e fuma o dia todo sem causar ou prejudicar ninguém - senão a si mesmo. Ligeiro, conhece como poucos os becos, bocas e vielas da vila - toda viela e beco é uma boca. É uma aberração, um mistério como criaturas assim, desprovidas dos mínimos recursos cognitivos, intelectuais, psicológicos, morais e motores sejam capazes de ações mais ou menos sofisticadas e complexas como essas! Talvez estejam condicionados e as executem mecanicamente ou instintivamente. Sem duvidas que são a exceção, não a regra!
Agora enquanto reflito sobre isso e escrevo, Paizão e Paiakan podem fumar ou tombar tranquilos, certamente alguns técnicos, especialistas, autoridades políticas, publicas, intelectuais ou morais estão em vigília construindo estratégias e teorias mirabolantes que assegurem a sua saúde física e mental e os seus direitos! Nem precisam pensar ou se manifestar sobre isso, outros com elevados recursos de toda espécie decidem por eles sobre o seu destino! Por isso não precisam participar de seminários, audiências publicas, grupos de estudos, conferencias e todos esses eventos cujas decisões afetarão diretamente as suas vidas sem que sejam assim os protagonistas! Sem duvida que é por essas razões ainda que as técnicas do CAPS - via de regra, psicólogas, pedagogas, enfermeiras - logo ao lado não fazem abordagem de rua e tampouco visitam os becos, vielas ou as famílias dessas pessoas. E assim se faz política publica no Brasil, com gente altamente especializada, crítica, altruísta, abnegada, engajada e comprometida com os direitos humanos, a democracia, a cidadania, a sociedade e a vida.
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