Esse foi o nome da reportagem do extinto programa de televisão de
meados dos anos 90 - Na Rota do Crime. A “mansão das drogas” era apenas a casa
dos meus colegas de infância, que eu e outros conhecidos frequentávamos quase
que diariamente. Estava muito longe de ser uma “mansão” - senão para as exigências do espetáculo vulgar e a sanha da mídia sensacionalista. Era uma casa baixa de
dois dormitórios e um quintalzinho na frente. Os caras faziam o trafico lá e,
como eram todos usuários de alguma droga e alguns dos fregueses fossem amigos
de longa data – como no meu caso -, eles permitiam que também se usasse a droga
lá. A casa era até confortável, mobiliada e sempre tinha alguma comida, bebida
e musica. Então quem era da casa ficava numa boa, fumava, cheirava, conversava,
ouvia um som, tomava umas e se divertia. Às vezes, eu chegava lá só pra comprar
um baseadinho e, conversa vai, conversa vem, alguém apresentava outro. Depois
chegava mais um e oferecia uma carreira, aí continuava conversando e assim
passava o dia todo sem sair de lá e até sem gastar nada. Era tanta gente que
passava por lá, tanta droga, tantos assuntos e, por incrível que pareça para as
pessoas comuns era um lugar divertido - nunca presenciei uma discussão, uma
briga ou agressão, quanto mais armas, tiros ou mortes. Não havia hostilidades
ou tristeza no ambiente, embora não fosse saudável. Ouvia-se, via de regra,
muita besteira, papo furado e brincadeiras de rapazes em busca de diversão e
auto-afirmação.
Jogávamos sempre dominó ou palitinho e, quem ganhava fazia o
baseado ou esticava as carreiras. Quem perdia, se estivéssemos usando cocaína
tinha que comer uma bolacha água e sal a seco como castigo e, se estivéssemos
fumando tomar um copo de pinga. Quem já usou drogas sabe o que significam esses
prêmios e castigos. Como eu ganhava muito, em ambos os jogos, me divertia vendo
os outros se engasgando comendo um pacote todo de água e sal - a seco! - ou
caindo de tanto tomar pinga. Como eu também tinha crédito, muitas vezes
pendurava, rachava com o traficante que era também meu amigo e assim nunca
faltava droga para ninguém. Gente especialista e/ou comum não consegue
entender isso, escapa a moral e as teorias. Não me importo. O mundo, as pessoas
e a realidade são mesmo inconcebíveis, ininteligíveis, complexas demais para convenções
e padrões.
Viviam nessa casa ao todo só três pessoas, porem, sempre tinha no
mínimo outras três diariamente em função dos negócios. Como o movimento era
grande, às vezes chegava a ter quase vinte pessoas de uma única vez! Eu cheguei
a passar algumas madrugadas lá. Nessa época apenas cheirava e fumava maconha.
Há época só dois dos caras que traficavam eram maiores de idade – eu era, mas
não traficava. No dia em que a polícia invadiu a casa com a reportagem eu não
estava lá. Encontraram cocaína, maconha e crack. Dois foram mandados para a
FEBEM. Vi o programa na televisão em casa, ao lado dos meus pais e eles jamais
desconfiaram que eu frequentasse aquele lugar. Isso tudo aconteceu há uns 14
anos (1997), mais ou menos. Desses caras um está bem, trabalhando e nunca mais
se envolveu com o crime. Um morreu, outros dois estão presos e outros dois
passaram uns bons anos presos e hoje estão soltos. Não sei que vida levam e não
tenho mais contato. Torço apenas para que estejam bem, afinal, são jovens
ainda, tem filhos pequenos e basta de sofrimentos para uma vida. Se morrerem,
no entanto, morrerão como sempre viveram; ignorados pela sociedade e o Estado.
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