Essas
linhas não tratam de poesia. A pedra no caminho não é a do Drummond. A pedra no
meio do meu caminho é bem menos romântica ou abstrata. Ela não é nem a
"pedra de tropeço" com que Jesus chama Pedro, nem aquela no caminho
dos pequeninos - Mateus 16, 18. Muito pior, dispensa metáforas, espécie de
servidão e flagelo na Terra, estágio final do processo perene de desumanização
e invisibilidade a que os homens estão submetidos em nossa sociedade. Ela é
real, cruel, espreita nas ruas e coloca-os sob a terra abaixo do chão. Embora
tenha conhecido, inclusive por meio dela - não exclusivamente! - tanto o
inferno quanto o submundo, não vivi apenas neles ou em função deles. Embora
muitos sejam céticos ou cínicos - ambos acomodados -, preciso dizer que nem
todos os usuários de crack são meras criaturas insensíveis e ignorantes – zumbis,
nóias, “pedreiros” ou crackudos. Embora tenha consumido milhares de pedras de
crack, conheci pessoas, lugares, livros, idéias. Construí coisas,
relacionamentos. Desfiz tudo e desfiz-me. Perdi tudo, renunciei a tudo,
inclusive a liberdade e a vida. Abri as portas do inferno e entrei. Lutei,
perdi e me acomodei. Escapei da morte e do encarceramento por razões que ignoro
e me abstenho de especular.
Marcão
me ensinou a paciência e a serenidade diante do desespero. Com Shakespeare, Dostoievski e Camus a psicologia humana, os dramas e as tragédias dos homens – sublimes
e medíocres. Alexandre me disse na prisão que as aulas o faziam esquecer-se que
estava preso. Tolstói, Hugo e Hesse que a graça,
a força, a beleza dos homens reside na simplicidade tanto quanto na natureza.
A solidariedade aprendi entre ex-viciados, presos, moradores de rua,
abandonados, marginalizados e excluídos morando em uma pensão. E Machado, Lima
Barreto, Graciliano, Fitzgerald, Hemingway, Orwell, Gorki, Wilde,
Pessoa, Sá Carneiro, Rilke, Paz, Neruda e Rimbaud me ensinaram mais sobre a
humanidade, a política e a filosofia do que os seis anos que passei na cátedra.
Embora tivesse muitas pedras no caminho, minha vida não foi só quedas e
tropeços como preferem enxergar os cínicos e preconceituosos e, talvez por isso
tenha sido uma escalada, aquilo poderia ter sido apenas uma trilha.
Muito bom o Blog, Mario. Parabéns pela coragem e não estamos sozinhos.
ResponderExcluirSem duvidas que não estamos! Obrigado pela atenção e consideração!
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