sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Confissões.

Dos pecados da minha vida - falo pecados na falta de palavra melhor ou mais adequada -, que não foram poucos, do que mais me arrependo são as mentiras. Poucas coisas, penso eu, destroem tanto a vida, as relações, o futuro. Não me escuso com a dependência química, o crack, assumo que furtei dentro de casa pra manter o vício - dos meus pais, da minha companheira, irmão, filha, amigos, não poupei ninguém. Admito sim, que fiz isso tudo! Foi dinheiro, joias, celular, tudo consumido no crack. Mas, isso, pra mim não foi o pior - o pior mesmo foram as mentiras, incontáveis mentiras! Pior que o furto é roubar a verdade - corromper a confiança. Foram as mentiras que destruíram a minha vida, corroeram as minhas relações, roubaram a minha dignidade e humanidade - moralismo pequeno burguês? Não, até pra egoísmo, hedonismo ou o que quer que o valha devem haver limites - talvez eu também seja um pequeno burguês. Porém, de fato, todo o resto faz falta, mas, não são imprescindíveis - muito longe disso. Todo o resto se recupera, não arranham a autoestima, arruínam a confiança, ameaçam o futuro. Eu perdi o tempo presente e o futuro no vício. Eu enganei, ludibriei, menti, minimizei a confiança alheia e desprezei o outro - entre eles até mesmo a minha única filha. Ela era criança, tinha só dois anos, nada entendia, mas, eu sei que ela sentia - a minha ausência, minha conduta evasiva, meu medo, minha vergonha, culpa. Era assim que eu vivia - se é possível chamar isso de vida. Eu andava feito um pária - nas sombras, nos becos, no limbo. Me consumindo no crack, na culpa, vergonha, raiva e tristeza. Renunciei à vida. Foi uma década e pouco nisso. Parece estranho ou loucura, mas, recordo que quando estava sob efeito - eu sempre evitava ficar perto da minha filha assim -, já quase "limpo", quando chegava em casa, eu percebia que ela me olhava com algum receio e desconfiança, daí eu entrava numa revolta profunda comigo mesmo, me deprimia, me envergonhava, mergulhava de cabeça no fundo do poço. Ás vezes, ela me olhava assim, noutras, ela me acolhia, me abraçava, beijava, e o efeito era o mesmo, tristeza profunda, vergonha, raiva de mim mesmo. Porque eu havia mentido, eu estava mentindo, a minha vida era uma mentira e eu era a grande mentira! Uma sombra de homem, pai, profissional, cidadão, companheiro, amigo, irmão, etc. Agora enquanto escrevo ainda me envergonho, entristeço e me revolto. E receio que a minha existência, talvez, seja só isso mesmo, mas, não sinto pena de mim e acho que nem mereço coisa alguma - respeito, compaixão, atenção, solidariedade. Contei, inventei diversas mentiras pra justificar minha ausência, minha omissão, por causa de alguns instantes de torpor e fuga - ainda hoje não sei exatamente do que fugia, se de mim mesmo ou da vida, da realidade ou do passado. Só sei que igual a mim, existem milhões de doentes - do coração, da cabeça, da vida e da alma. Anestesiados de si e de tudo. Lamento pelas mentiras, não posso voltar atrás, só posso admiti-las - espero um dia poder compensá-las, se isso for possível. E espero que alguns me perdoem, que outros tantos sobrevivam a isso, e que um dia eu mesmo possa me perdoar....

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