sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Motivações


Em 2005 jovens protestam na França. Os protestos transformam-se em revolta. A revolta em conflitos. A repressão resulta em mortes. Os protestos iniciaram-se devido à morte de um jovem inocente vítima da polícia francesa. Hoje os protestos na Inglaterra também são motivados pela morte de um jovem inocente vitimado pela polícia. Atualmente ocorrem protestos pela educação organizados por estudantes no Chile e na Argentina. No Chile os conflitos com a polícia são constates e a despeito dos acenos para negociação do governo os estudantes não cedem com relação as suas reivindicações. Ampliaram-se as reivindicações sobre as questões relativas à educação e os atores sociais, para reformas na Constituição e sindicatos, respectivamente, resultando em maiores confrontos e paralisação geral.
Muitas diferenças existem entre esses protestos, países, condições, circunstâncias e culturas. Do ponto de vista econômico, Chile e Argentina estão em desenvolvimento em comparação a França e Inglaterra. Na política, os europeus são democracias estáveis, enquanto que os sulamericanos libertaram-se a apenas poucas décadas de ditaduras militares. É histórica a tradição de levantes e revoltas populares na França e Inglaterra. A maior de todas, ou pelo menos a mais famosa – Revolução Francesa – teve lugar na França. Este ano celebra-se ainda os 140 anos da Comuna de Paris. O movimento estudantil de 68 tambem iniciou-se lá. A Revolução Industrial iniciou-se na Inglaterra. Os anos 70 e 80 foram marcados por incontáveis protestos e revoltas populares – sindicatos e estudantes - na Inglaterra contra o governo neoliberal da “Dama de Ferro.”
Algumas diferenças são dignas de nota. Tocqueville e Carlyle, entre outros, debruçaram-se sobre a Revolução Francesa. Carlyle foi critico feroz da Revolução, do Sansculotismo, temia e era avesso ao poder popular. Ambos denunciaram com veemência a violência, eram liberais e burgueses, admitiam a participação popular na política com muitas reservas e receios. Embora o senso comum e alguns setores pensem de forma dissimulada a Revolução, devido à tomada da Bastilha, como um levante popular, ela começou décadas antes com as ideias libertárias e liberais dos filósofos iluministas. As influências vinham da Inglaterra - monarquia constitucional estável, nação laica, berço do liberalismo econômico e político, potência econômica e militar global. Os filósofos franceses foram influenciados por Hobbes, Locke, Moore, Smith, Bacon, Newton. A revolução Americana foi o estopim do movimento francês – os franceses apoiaram abertamente os americanos. Assim a monarquia soterrou as suas finanças – uma guerra cara, em outro país, sem conotação nacionalista ou de defesa.
De fato, filósofos não pegam em armas. Eles forjaram o movimento revolucionário. Moldaram os ideais da revolução. Modelaram as suas lideranças. Suas ideias desenvolveram aquilo que Tocqueville identifica como o “espírito da revolução.” Isto só foi possível porque, embora fosse uma monarquia absolutista estável, essa estabilidade política permitiu o lastro da burguesia. Na segunda metade do século 18, Paris era uma metrópole. A elite e a burguesia francesa eram cosmopolitas, ilustradas e Paris era a capital européia da cultura e da liberdade intelectual, religiosa e de imprensa. A Inglaterra dessa época tinha apenas 50% da sua população analfabeta. Rousseau e Voltaire vendiam 100 mil exemplares dos seus livros – Cândido, A Nova Heloísa, O Emílio (este era um tratado sobre a educação). Os intelectuais franceses elaboravam a Enciclopédia e pretendiam reunir e democratizar o saber. Por outro lado, milhares de parisienses viviam na mais absoluta miséria, desprovidos de terras, direitos e garantias legais. A Revolução acaba com a escravidão nas colônias, com a pena de prisão por dívidas, faz a reforma agrária e institui o ensino primário gratuito e obrigatório – Constituição de 1791.
Marx e Engels reconhecem o potencial revolucionário da burguesia – Revolução Americana, Francesa, Industrial. Ela destruiu antigas relações e reconstruiu a sociedade a sua imagem e semelhança. O período turbulento que se segue a Revolução, o cenário de instabilidade política nacional e internacional, as disputas internas – Jacobinos e Girondinos – terminam com chegada de Napoleão ao poder. As lições que se seguem: o processo histórico europeu – inglês e francês – é caracterizado por movimentos sociais revolucionários. O acesso a educação possibilita a construção de identidades coletivas e estruturas organizadas em torno de questões públicas, bem como as condições subjetivas – consciência - necessárias a mobilização, organização e ação – da América protestante, a Francesa e Industrial passando pelas revoltas atuais no Chile, Argentina, França e na Inglaterra.
O Chile e a Argentina, desde o século XVIII possuem elites ilustradas e seus índices de alfabetização e analfabetismo sempre foram diferentes dos brasileiros tanto em nível quanto em escala – ainda hoje possuímos 15 milhões de analfabetos e menos da metade do percentual de universitários do Chile. Por outro lado, a Argentina tem pouco mais de 2,5% de analfabetos e longa tradição na educação – a Lei da Educação Comum é de 1884 e de 1868/1874 teve um presidente educador (Domingo Sarmiento). O processo histórico de construção dessas nações – independência - também é anterior ao brasileiro e deu-se no âmbito de lutas e revoltas sociais e populares. Isso ajuda a entender o poder de mobilização e organização dos movimentos sociais e populares desses países em torno de questões publicas – violência, corrupção, trabalho, direitos. Já a juventude e os movimentos sociais - sindicais e estudantis - brasileiros, embora gostem de marchar, suas motivações são pouco ortodoxas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário