Algumas pessoas leem o que eu escrevo. Algumas ouvem o que
eu falo. Poucas. Bem poucas. Não me importo. Pouco do que escrevo é agradável ou
interessa as pessoas. Pediram-me que escrevesse sobre meu processo de
recuperação. Ainda não estou recuperado. Tenho me sentido bastante tentado, não
pelo desejo de usar droga, mais pela vontade de me abandonar e tudo o mais. Dizem
que a definição de insanidade é fazer as mesmas coisas sempre esperando
resultados diferentes. Assim tem sido a minha vida – não uso drogas, não engano
mais ninguém, sigo com fé, esperança, batalhando, estudando, ajudando os
outros naquilo que posso. Os resultados porem continuam os mesmos da época em
que era um contumaz viciado, mentiroso, ladrão e depravado. Alias, tudo piorou, porque agora estou só e comprovando diariamente que ninguém,
absolutamente ninguém reconhece ou valoriza o trabalho, a luta e o esforço alheios. Entendo cada vez mais os miseráveis das ruas e os companheiros que convivi na prisão. Essa lição que me é cara, não se aprende em livros e nem nos bancos escolares. Essa o ilustrado das décadas de estudos e pesquisas e que daria a vida por 30 segundos no Fantástico, coitado, não sabe! Na verdade nunca quis saber, o conforto e segurança do gabinete só pode ser bom. Não volto a usar
porque cansei de andar em círculos, mas, estou cansado também de olhar pra
frente e andar em linha reta. Não sei aonde meu cansaço vai me levar. Só sei
que não me sinto recuperado, porque a droga para mim não é problema, o problema
esta fora dela e é ele que me atinge todos os dias, limpo ou não.
Faz um ano e meio que estou sem trabalho. Nem falo de
emprego porque nem sei o que é isso a mais de uma década. Durante esse tempo
fiz projetos para ONG’s, OSCIP’s, associações de bairro, amigos - quase sempre de graça ou quase e em troca de promessas de emprego ou trabalho. Fiz trabalhos acadêmicos,
pesquisas, textos, relatórios, aulas, planos de ensino. Abri uma Empresa na
modalidade MEI. Se somar o numero de paginas que produzi ultrapassam
as milhares. Desnecessário dizer que para cada pagina escrita corresponde
outras tantas lidas. Nada valem em terra de ignorantes e imbecis digitais ou televisivos. Participei de incontáveis
processos seletivos – fiz provas, testes, dinâmicas, entrevistas – providenciei
documentos para inscrições e elaboração de contratos para oportunidades que não
se concretizaram por diversos motivos, sobretudo, por motivações escandalosamente
subjetivas e pessoais. Gastei muito dinheiro que não tinha e tirei da minha
filha acreditando em pessoas sem caráter e incompetentes, que ignoram que seja
obrigação do profissional, conforme as exigências da impessoalidade, encerrar o processo, seja ele positivo ou negativo. Muitos falam em crise ou "apagão da qualificação" no mercado de trabalho. Pois eu afirmo com conhecimento
de causa, o "apagão da qualificação" resulta da mediocridade que caracteriza os departamentos de recursos humanos determinados pelas “modas” ou tendências
corporativas do mercado de trabalho, para ao final, quando no entanto, quase sempre tudo resume-se ao bom e
velho Q.I. ou a empatia do poderoso do dia. Chegamos ao ponto de em um processo
seletivo para Educador Social, após analise de currículo, redação, elaboração e
entrega de planos de ensino e aulas, apresentação de aulas teste, passarmos uma
semana em uma (de) formação em que nada se ensinava e nada se aprendia,
passando o dia entre dinâmicas de grupo, discussões rasas e atividade lúdicas para ao final selecionarem por critérios pessoais - amizade, empatia, indicação.
Conforme fossem aulas para jovens, percebi que supõe-se que "acolher" o jovem é tratá-lo de forma infantil ou como deficiente mental. Houve uma dinâmica em que tivemos que nos travestir ou disfarçar conforme se catalogam os jovens de acordo com as suas “subculturas”: emos, punks, rappers, gays, etc. Como se fosse possível, em uma paródia, vivenciarmos como em um laboratório aquilo que eles experimentam – subestima-se a cultura do jovem e a inteligência alheia a um só tempo! Em outra tínhamos que andar em círculos e quando o sujeito falasse “trotola”, parar, trocar de lugar e nos apresentar. E assim seguiu-se a insanidade e a bizarrice até o dia da atribuição de aulas - mais essa! Para coroar esse circo grotesco - no final evidenciou-se que tudo não passava disso mesmo, um espetáculo grotesco -, evidentemente tudo é levado a cabo por gente vulgar e incompetente, posto que as vagas já estivessem previamente determinadas por outros critérios que nada tem a ver com competência, conhecimentos ou experiências. Antes se definiram por indicações políticas, preferências e simpatias que nem se davam o trabalho de disfarçar, expondo-as nas redes sociais antes mesmo de encerrado o processo. Isso aconteceu esse ano (2011) e essa via crucis levou três meses. Essa é a verdadeira crise do mercado de trabalho e o apagão da qualificação e da ética que insulta o trabalho e o trabalhador cotidianamente, sem chance alguma de defesa ou a quem recorrer. Quem duvida se atreva a demonstrar qualquer cultura, sofisticação, ousadia ou originalidade em um processo seletivo? Atreva-se a demonstrar qualquer senso critico ou visão de mundo? Atreva-se a criticar o lugar comum, o senso comum ou os valores e clichês do mercado, bom como a moral da burguesia politicamente correta? Atreva-se a demonstrar senso ético e de responsabilidade publica e social? Pior do que superar o vício individual é enfrentar os vícios sociais. Pior do que recuperar a saúde e a sanidade é recuperar a dignidade. Se para na primeira não te dão a mão, na segunda o fazem só para empurrar... . Porque não pude recuperar minha vida ainda não me sinto recuperado, a droga não é nada perto do mal que a sociedade faz sóbria, pacificada, altruísta e religiosa.
Conforme fossem aulas para jovens, percebi que supõe-se que "acolher" o jovem é tratá-lo de forma infantil ou como deficiente mental. Houve uma dinâmica em que tivemos que nos travestir ou disfarçar conforme se catalogam os jovens de acordo com as suas “subculturas”: emos, punks, rappers, gays, etc. Como se fosse possível, em uma paródia, vivenciarmos como em um laboratório aquilo que eles experimentam – subestima-se a cultura do jovem e a inteligência alheia a um só tempo! Em outra tínhamos que andar em círculos e quando o sujeito falasse “trotola”, parar, trocar de lugar e nos apresentar. E assim seguiu-se a insanidade e a bizarrice até o dia da atribuição de aulas - mais essa! Para coroar esse circo grotesco - no final evidenciou-se que tudo não passava disso mesmo, um espetáculo grotesco -, evidentemente tudo é levado a cabo por gente vulgar e incompetente, posto que as vagas já estivessem previamente determinadas por outros critérios que nada tem a ver com competência, conhecimentos ou experiências. Antes se definiram por indicações políticas, preferências e simpatias que nem se davam o trabalho de disfarçar, expondo-as nas redes sociais antes mesmo de encerrado o processo. Isso aconteceu esse ano (2011) e essa via crucis levou três meses. Essa é a verdadeira crise do mercado de trabalho e o apagão da qualificação e da ética que insulta o trabalho e o trabalhador cotidianamente, sem chance alguma de defesa ou a quem recorrer. Quem duvida se atreva a demonstrar qualquer cultura, sofisticação, ousadia ou originalidade em um processo seletivo? Atreva-se a demonstrar qualquer senso critico ou visão de mundo? Atreva-se a criticar o lugar comum, o senso comum ou os valores e clichês do mercado, bom como a moral da burguesia politicamente correta? Atreva-se a demonstrar senso ético e de responsabilidade publica e social? Pior do que superar o vício individual é enfrentar os vícios sociais. Pior do que recuperar a saúde e a sanidade é recuperar a dignidade. Se para na primeira não te dão a mão, na segunda o fazem só para empurrar... . Porque não pude recuperar minha vida ainda não me sinto recuperado, a droga não é nada perto do mal que a sociedade faz sóbria, pacificada, altruísta e religiosa.
Só discordo de "...ninguém, absolutamente ninguém reconhece o trabalho, a luta e o esforço alheios." Ta cheio de gente boa no mundo, cheio. A maioria acuada, paralizada ou cansada de lutar por situaçoes melhores por direito. E digo mais, tem muita mais gente boa do que ruim, muito mais e acredito que é preciso entrar no sistema por brechas ou abrindo caminho a foice para mudar o que quer que seja. Ou aderir ou ainda inventar novas formas de se comunicar, interagir, intervir.
ResponderExcluirbonito o quadro do Goya. pelo menos você tem bom gosto.
ResponderExcluircargo no governo é isso: um lugar comum que brinca com a vontade daqueles que querem transformar.
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