segunda-feira, 23 de julho de 2012

Terceiro Setor

O movimento social fortaleceu-se com a democracia e a globalização. Desde a Eco-92, devido a importância e a grande visibilidade deste evento, percebe-se uma enorme expansão e incremento das Organizações da Sociedade Civil (OSC's) e Organizações Não-Governamentais (ONG's) iniciadas com a democratização e amparadas pela Carta de 88. Conheci-as exatamente por essa época, por meio do movimento punk. Em 1994 fazia campanha para o PT e era voluntário da S.O.S Mata Atlântica, então a ONG com maior visibilidade e penetração na sociedade. Lembro-me que, embora fosse office-boy e recebesse um salário minímo mês (70 reais), colaborava financeiramente com eles e ansiava ser chamado para alguma atividade - em dois anos nunca fui. Recebia eventualmente via correio um jornalzinho, uma carta de agradecimento e um adesivo. A despeito da democracia e do carater social, em termos de mobilização e participação, do ponto de vista das suas ações e da transparência sempre me pareceu bastante restrita e fechada. Aos poucos percebi o carater elitista dela e de diversas outras - senão a maioria.
Curioso tambem é o carater privado delas, tanto em termos de organização e administração corporativa capitalista de mercado quanto no que diz respeito a sua apropriação - digamos assim - por indivíduos ou grupos empresariais. Não chega a ser novidade tambem, que muitos membros dessas instituições recebem altos salários, dignos de executivos de grandes corporações. A esse respeito, um exemplo emblemático alem da S.O.S Mata Atlântica é a Ação Educativa - a primeira desde a fundação é controlada pelo Sr. Mantovanni e a segunda pelo Sr. Haddad. De acordo com as "exigências" - ou inconveniências? - democráticas e legais - estatutárias -, percebe-se nada mais do que uma constrangedora "dança das cadeiras" em que, com mais ou menos poder, os mandatários permanecem os mesmos ou são substituídos eventualmente por um circulo interno bastante restrito. No RJ, há 17 anos que o Cômite para Democratização da Infomática é controlado pelo Sr. Baggio. Está claro que a democratização deve ser só da informática! Qualquer semelhança com a estrutura sindical brasileira, talvez não seja mera coincidência - em termos de apropriação da máquina e cooptação pelo Estado! Sem dúvidas, como se percebe, maior que o apreço pela democracia é o pelas causas sociais! O carater assistencialista, paternalista e clientelista de muitas delas revela tanto a sua vocação elitista/autoritária quanto a adesão as práticas políticas tradicionais e ainda vigentes.
Igualmente curioso é o status à "gauche" que muitas ostentam ou adquiriram. Penso que tal explica-se, de um lado, pelo componente "social" e de outro pela sua origem e/ou ligação de seus quadros com setores da esquerda - política ou acadêmica. Esse fato, por sua vez, explica uma certa aura de pureza ética e moral, bem como a blindagem que o terceiro setor adquiriu - qualquer semelhança com um certo partido incapaz de autocrítica ou aceitá-las não deve ser mera coincidência! Por outro lado, me parece que para muitas delas, inclusive para as citadas, não há nenhuma contradição nem constrangimento em receber "recursos" de bancos, multinacionais, igrejas ou grandes grupos empresariais nacionais ou estrangeiros, sobretudo, norte-americanos. Me parece pouco provável que uma instituição financeira, uma igreja, uma multinacional - como a Ford, a Coca Cola, IBM, Telefonica, entre outras - ou o grupo Globo, por exemplo, financiem movimentos sociais de esquerda - socialistas, libertários ou comunistas - ou que estejam diametralmente em antagonismo com os seus  valores ou interesses. Qualquer semelhança com movimentos ligados aos Direitos Humanos que aceitam recursos de Washington tambem não deve ser mera coincidência! Parece que para eles não há nenhum problema de carater ético ou moral, desde que não seja de domínio público que os USA não sejam signatários do Pacto de San José e sejam tambem um dos seus grandes violadores no mundo, bem como que o Sr. Ford, por exemplo, tenha sido um notório racista e agraciado com a maior condecoração que um estrangeiro poderia receber da Alemanha nazista por serviços prestados ao III Reich - Grande Cruz da Águia Alemã. Ford, inclusive, foi até citado textualmente por Hitler em Mein Kampf pela obra O Judeu Internacional - considerada de sua autoria.  
A combinação Democracia & Globalização, no contexto do fim da Guerra Fria  redefiniu ou simplesmente subverteu alguns conceitos, sobretudo, o de esquerda. Com efeito, tornou-o mais volátil, elástico e ambíguo. O triunfo da hegemonia das democracias ocidentais - leia-se USA - encerrou o fim das ideologias, utopias e da história - para alguns cínicos ou ingênuos! A revolução tornou-se obsoleta, as macro-teorias "superadas", a ruptura ou transformação cedeu ao doce discurso politicamente correto da inclusão, a ideologia ao establishment e o Estado ao mercado! No bojo desse processo, a bandeira da democracia - entre outras -, historicamente no Brasil ligada a setores de esquerda, paulatinamente foi absorvida por setores conservadores e reacionários como forma de aproximarem-se de grupos sociais e proceder a manutenção do poder. Talvez isso ajude a entender o discurso aparentemente "social" de certos partidos ou políticos e algumas alianças antes impensáveis e inaceitáveis.
Finalizando, refiro-me apenas as instiuições que de alguma forma conheci do lado de lá do balcão, atuando de algum modo - Instituto São Paulo Contra a Violência, Alfabetização Solidária e CUFA são financiados pela Fundação Roberto Marinho, o CEBRAP pela Fundação Ford e faz pesquisas para a Fundação Telefonica - Florestan Fernandes recusou emprego no CEBRAP após o AI-5 quando soube que este era financiado pela referida fundação -, o Afroreggae - do José Junior - pelo banco Santander. Com efeito, antigamente exigia-se mais da esquerda - ética, coerência, formação, disciplina - tanto do indivíduo quanto das instituições. Antigamente tambem chamava-se isso tudo de demagogia e/ou oportunismo.

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