“Nós
somos o único partido revolucionário brasileiro!” Essa era a frase
repetida ad infinitum com veemência e soberba pelo dirigente
partidário uruguaio. Retirada do estatuto, programa e manuais do partido,
colada como mantra a boca de dirigentes e militantes. Do ponto de vista
formal, cumpre todos os requisitos de acordo com as prerrogativas do marxismo-leninismo
- algo alem disso é demasiado desonestidade, oportunismo e presunção. Aos
fatos, na luta de classes é imperativo considerar os fatos!
Um
estatuto, uma sede, a burocracia, a militância, as bases de atuação, os meios e
recursos. Como muitos partidos, o da “Causa Operária” também ignora e
dispensa militância e bases de atuação pra sobreviver – basta o milhão-ano da
União, pois isso é o que é publico. Por seis meses acompanhei-o em SP e RJ,
comparecendo com freqüência a reuniões e outras atividades na sua sede em São
Paulo. Por isso sei que a despeito do milhão de reais-ano arrecadados da União
a “Causa” não dispõe sequer de diretórios ou sedes na maioria dos Estados da
federação, sequer nas capitais, nem no Rio de Janeiro! Nem nas grandes cidades
industriais como Guarulhos, São Bernardo, São José dos Campos, Campinas,
Santos, Osasco! A “Causa” deve ter outras prioridades mais importantes que se
aproximar das classes laboriosas.
A sede da
“Causa” tem pouco ou quase nada de “operária”. Fica na rua Apotribu, 111
no aconchegante bairro de classe media alta da Saúde em São Paulo –
é o 10º distrito com o maior IDH da cidade, o que não é pouco numa das maiores
metrópoles do mundo . Imóvel térreo, uma casa confortável com amplos cômodos
para abrigar um auditório, escritório, salas de reuniões, biblioteca, copa,
gráfica – o maquinário pesado da gráfica fica em outro imóvel e o arquivo
também. Contando com a “Comuna” – espécie de “viveiro” da militância jovem
mimada e aburguesada - são quatro imóveis apenas na capital paulista. A “Causa”
é prolífica no repertorio “revolucionário” tanto quanto debochada! Convenhamos,
“Comuna” num bairro de classe média alta é comédia de gosto duvidoso! Adequada,
porem, com o perfil da sua militância jovem: os filhos e filhas da classe media
e classe media alta, egressos dos melhores e mais caros colégios e
universidades publicas! Uma olhada rápida pelo seu perfil na rede social não
deixa quaisquer duvidas sobre as suas origens, gostos, hábitos burgueses.
Com
efeito, se não conhecesse a tradição política brasileira, diria que
paradoxalmente o partido da “Causa Operária” carece de operários, proletários
ou trabalhadores, quanto mais pobres e populares entre a sua militância e
quadros! É o que se constata em São Paulo nas atividades, reuniões e encontros
que ocorrem regularmente na sede do partido. Tanto quanto a burocracia a
militância é classe media, egressos da burguesia – estudantes de universidades
publicas, profissionais liberais, burocratas sindicais, partidários, servidores
públicos. Conheci ao menos três fotógrafos, um bancário, alguns
trabalhadores dos Correios – poucos carteiros -, um gráfico – o empregado do partido
na sede –, dois sindicalistas – frios e Correios -, dois advogados, quatro
professores da rede publica e muitos estudantes – USP, Unifesp, UnB, Unesp,
Unicamp. Eventualmente encontrava por lá algum carteiro ou outro
trabalhador, exclusivamente em época de maior atividade - campanha salarial ou
eleição dos Correios – ou em reuniões de célula do partido. Resumindo, às vezes
via um carteiro ou algum outro trabalhador assalariado na sede do partido –
sempre incumbido de tarefas que a burocracia e a “vanguarda” da militância se
excluíam, tais como vender jornal, rifas, colagem de cartazes e
panfletagem. Curiosamente não cabia nessa dita “vanguarda” trabalhadores
subalternos e assalariados, senão dirigentes sindicais, partidários,
estudantes, servidores e profissionais liberais.
A base do
partido, se é que podemos chamar assim, compõem-se por alguns sindicatos – uns
dois ou três, sobretudo, o de BH/MG - ligados a ECT e o movimento estudantil.
Atuam ainda junto ao Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Frios,
Federação dos Correios e em uma comunidade em SP – nesse sindicato a atuação é
irrelevante por diversos motivos (sindicato sem expressão, militantes e sem
legitimidade junto às bases). A carência de militantes é tanta e tamanha que
quando estive por pelo menos cinco vezes na campanha salarial dos Correios ano
passado no RJ, fiz o trabalho junto às bases sozinho em uma ocasião, em outra
com dois militantes de São Paulo e nas outras vezes com dois companheiros de MG
– o Carioca e o Dejair. Repito: o partido não tem sede no RJ e nem militantes.
Cobríamos a cidade do RJ – os três ou quatro principais postos de trabalho alem
de Nova Iguaçu e Niterói - sem qualquer apoio logístico, material, humano,
tecnológico e financeiro – senão o mínimo pra comer e dormir. Conforme fossemos
reles peões militantes, tudo era “organizado” para nós na base do improviso, do
amadorismo, do mandonismo e desmandos, de cima pra baixo, sem dialogo para que
ainda executássemos sob pressão, no braço, no peito e na raça. Em todas as
ocasiões carregávamos no braço grandes volumes de panfletos, cartazes e jornais
de ônibus. Percorríamos ainda longos percursos a pé. Muitas vezes precisava
levar e carregar uma caixa de som de 15 kg de ônibus e a pé, porque os
companheiros carteiros iam no carro da empresa que não permitia o transporte de
terceiros e volumes.
Não é
preciso ser sindicalista pra reconhecer que a base da região metropolitana
carioca é maior e mais relevante que a de Bauru, em todos os aspectos. Nesse
sentido, evidente que se deveriam envidar maiores recursos e apoio ao trabalho
na região mais importante depois de SP para a categoria. Na prática a realidade
é outra. Pra importância e dimensão da cidade do Rio de Janeiro e região
metropolitana apenas três militantes, milhares de panfletos, cartazes e jornais
e nenhum carro ou quaisquer outros recursos. Por outro lado, em Bauru, conforme
a equipe contasse com um burocrata do partido disponibilizou-se uma van com
motorista, apoio de militantes e sindicalistas – inclusive de MG –, seguranças
armados e uma equipe de filmagem – 12 pessoas ao todo! Questão de
estratégia “revolucionária”, evidente – 12 em Bauru (340 mil habitantes), 03 no
RJ (12,5 milhões de habitantes)!
O senhor
Tranquilo Móterle é um homem de 83 anos. Gaúcho, ex-padre, marxista e
militante popular por convicção, tem mais de cinco décadas de luta em
comunidades Brasil afora. Seu Tranquilo é o fundador do bairro Vargem
Grande na zona sul de São Paulo, há cerca de vinte e cinco anos. É o maior líder
comunitário do bairro, reconhecido em toda a região sul, fundador e presidente
da Associação de Moradores de Bairro União de Favelas do Grajaú (UNIFAG). Há
poucos anos ele se aproximou do PCO. Leu o jornal, fez contato e começou a
frequentar as atividades do partido. Em 2012 a sua revelia foi lançado
candidato a vereador pelo partido. Soube disso por ele mesmo, moradores da
comunidade e até por militantes do partido. Consta que ele foi filiado às
pressas e inscrito como candidato sem ser consultado, quando viu já estava
inscrito e candidato em São Paulo. Imprimiram alguns milhares de “santinhos”
para ele e isso é tudo o que o partido fez pra ele em termos de “campanha”,
embora o tenha lançado candidato compulsoriamente. Para espanto da
“intelligentsia” do partido seu Tranquilo obteve mais votos que todos os outros
candidatos da legenda, inclusive dirigentes e militantes com grande experiência
eleitoral e prestigio no interior do partido! Seu Tranquilo foi mais votado que
o candidato a prefeito pelo partido – ligada aos Correios e com diversas
candidaturas majoritárias anteriores - e que a própria filha do presidente
dele, ligada a USP e ao movimento estudantil feminista! Seu Tranquilo foi usado
de modo oportunista como termômetro para a cooptação de quadros comunitários e
saltos eleitorais junto as bases periféricas. Não fosse a iniciativa do Seu
Tranquilo em procura-los o PCO ainda estaria apenas na Apotribu, divagando de
forma acomodada, cínica e oportunista sobre as mazelas das
periferias que ele despreza e ignora. Seu Tranquilo abriu as portas da sua
comunidade pra eles e hoje assiste impotente ao esfacelamento da Associação que
fundou e o que sobrou dela ser tomado de assalto pelo partido.
Quando em
agosto de 2013 comecei a colaborar com a luta da comunidade por meio do PCO,
ela já estava numa relação mais estreita com o partido, na medida em que ele
bancava o jornal Voz do Bairro da UNIFAG – hoje ele
banca, diagrama, organiza, redige, estabelece preço e tiragem e a comunidade
cabe apenas distribuí-lo e vende-lo. O jornal, embora seja criação do Seu
Tranquilo e exista há alguns anos estava numa situação precária como a
Associação e boa parte daquelas que não renunciam a sua autonomia e
independência a outras entidades, seja ela um partido, sindicato, universidade,
ONG, igreja, etc. Como muitas associações de bairro autônomas e independentes,
sobrevive do trabalho voluntario e de escassos recursos recolhidos entre seus
próprios membros e algumas pessoas da comunidade, atuando de forma precária e
limitada.
Consta
que há alguns meses antes ainda tinha uma boa relação com o Psol, por meio do
deputado Carlos Giannazi, colaborando com a entidade na luta pela manutenção e
melhorias no bairro. Com a ajuda do deputado a Associação conseguiu uma
audiência publica na Alesp em meados daquele ano pra discutir com a Secretaria
de Habitação e outros parlamentares projetos que pretendem intervir no bairro
impactando toda a comunidade – desde o do Aeroporto em Parelheiros até um que
pretende criar um Parque Linear na região removendo diversas famílias da
comunidade ou mesmo extingui-la. Há mais de uma década, desde a gestão Luiza
Erundina que a comunidade convive em maior ou menor intensidade com ameaças de
remoções e extinção do bairro, lutando pela sua regularização e urbanização, situação
que se agravou durante a gestão Kassab e que persiste na atual.
É
importante destacar nesse processo que antes disso o PCO jamais havia atuado em
comunidades periféricas em parte alguma. Conforme também não tenha militantes
das periferias, ignora por completo a sua realidade e a dinâmica das
comunidades e lutas populares. Assim, atua rigorosamente de acordo com a sua
experiência sindical-partidária e a cartilha leninista-trotskysta desprezando e
combatendo tudo o que não cabe na ortodoxia ou serve a sua estratégia
infalível. Para eles as comunidades são pouco mais que bestas, portanto só
podem prestar-se ao cabresto e a albarda. Autoritários e arrogantes, não
negociam, intimidam; não formam, manipulam; não debatem, coagem. Presunçosos, a
comunidade, para eles, é só o coletivo do reles e desprezível lumpen. Massa de
ignorantes e embrutecidos, velhacos inescrupulosos, reacionários e oportunistas
suscetíveis a manipulação pela direita, dispostos a tudo para auferir vantagens
pessoais. Assim não tem o mínimo respeito pelas comunidades e suas lideranças
tradicionais, valores, tradições, cultura, saberes, historia e lutas!
Deslumbrados, os fanáticos têm a convicção de que a missão para a qual nasceram
é conduzir as massas, ainda que Marx tenha dito que “a emancipação dos
trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores.”
Na
“estratégia revolucionária” tudo é rigorosamente considerado a partir do
calculo da utilidade do sujeito ou grupo para os interesses do partido na
condução das ações. Desse modo, desnecessário dizer que tudo e todos são também
descartáveis. Invertem a lógica, os meios justificam os fins, assim os
procedimentos utilizados ignoram quaisquer escrúpulos, valendo-se da mentira,
difamação, calúnia, intrigas, insinuações, intimidação e ameaças.
Celerados manipuladores, quando alguém não mais serve aos seus propósitos ou
discorda das suas estratégias torna-se automaticamente “sabotador”, “vendido”,
“oportunista”, “anarquista”, “capitulador” ou “direita”, ainda que seja um
batalhador do bairro, tenha uma longa trajetória de lutas populares e sociais e
tenha servido ao partido até o dia anterior! No meu caso chegaram ao
cumulo de usar o meu passado de dependente químico pra tentar
denegrir a minha imagem junto a comunidade - como se a comunidade fosse
puritana, sóbria e reacionária como a pequena burguesia pseudo revolucionaria!
Insultam a um só tempo a verdade, a ética socialista e a inteligência alheia.
A
realidade cotidiana das comunidades é dinâmica e complexa, não se submete as
determinações teóricas e escapa as infalíveis estratégias. Culpa do povo
– burro, selvagem, indolente, indiferente, oportunista, alienado - que acha que
pode lutar por si só, se organizar de forma independente e não se submeter ao
"único partido revolucionário brasileiro" - todos os outros pro PCO
não passam da "esquerda pequeno burguesa"! Sintomático do desprezo
que os “revolucionários ilustrados” da classe média sentem pelo homem do povo e
a sua luta pela simples sobrevivência!
Antes da
minha chegada o PCO não havia ousado se instalar na comunidade – coube a mim
essa tarefa. Covardes, não ousavam se apresentar a comunidade – mesmo após
lançar a candidatura do Seu Tranquilo a revelia dele. Eventualmente surgia em
algumas reuniões restritas a direção da Associação ou em assembléias como meros
observadores. Espreitavam em busca da oportunidade, como fazem os predadores.
Em uma semana de trabalho na comunidade compareceram cerca de mil moradores na
Assembléia de agosto – a minha primeira na comunidade (foto). Fiz três ou
quatro falas e bastou pra incendiar a Assembléia. Bastou pra intimidar os
oportunistas da comunidade e os soberbos do partido. Bastou pra despertar o
respeito e a admiração do povo e a raiva e o medo de ambos os lados. Não me
deslumbro com a aclamação do povo, não acho que faça nada mais que a minha
obrigação em denunciar e atacar os interesses da especulação imobiliária e o
arbítrio do poder público - sou de comunidade (Pirituba) e militante das causas
populares ha mais de uma década, colaborando nas suas lutas na baixada
santista e Rio de Janeiro.[1] Admito, porem, que é
gratificante perceber o mal estar daqueles que pretendiam ser o centro das
atenções e dos que supunham que eu fosse apenas mais um técnico ou burocrata!
Após essa
Assembléia, diante tamanha mobilização e aceitação popular, vislumbrou-se a
possibilidade de construir instrumentos de luta no interior da Associação de
modo a subsidiar as suas ações e fortalecê-la perante o poder publico e outras
ameaças externas. Construiu-se uma pauta de reivindicações e uma agenda de
atividades e ações[2].
Em dois meses o partido abafou tudo, dividiu a entidade, desmobilizou a
comunidade renunciando as estratégias e ações deliberadas em Assembléia porque
não é do seu interesse o fortalecimento de uma entidade que não esteja
completamente subordinada a ele. Porque para eles o partido é mais importante
do que a comunidade e as suas lutas! Na sua versão burlesca da luta de classes
os interesses do partido prevalecem às necessidades populares! Porque a
política no Brasil, tanto a esquerda – parte significativa dela - quanto à
direita recusam o protagonismo popular, é negocio privado reservado às elites e
a classe media ilustradas – oligarcas, aristocratas ou vanguardas. Os primeiros
supõem possuir o dever e o privilegio de conduzi-los, representá-los e
defende-los e os outros o direito e a força para enfrentá-lo, controlá-lo ou
domesticá-lo. Por fim, tudo o que eu falo eu provo - está tudo documentado -,
porque o "ascenso" e o "levante" da periferia proclamado
pelo PCO é novidade apenas pra eles, as lutas populares nas suas mais variadas
formas sempre existiram e pertencem ao povo trabalhador.
[1]
Comentários de moradores sobre a minha participação
em uma Assembleia: Florisvaldo Lopes de Oliveira Calamos a boca desses
Peões, manipuladores, que não querem que o povo tenha voz! graça ao Mario Miranda Antonio Junior deixamos eles de cabeça
baixa e sem palavras. Obrigado Mario por calar a boca desses peões zeladores de
condomínio. Obrigado Lucitânia Galdino de Oliveira pelas foto.
Lucitânia Galdino de Oliveira voçe é sempre bem
vindo,alias voçe si tornou um vargemgrandence kkkkkkk abraços
Você fez um grande trabalho Mario em vargem grande, nunca iremos esquecer e sempre que necessário com certeza procuraríamos você infelizmente no mundo sujo que vivemos é inopinável não encontrar pedras no caminho,um grande abraço do seu amigo e companheiro Carlos Santana
ResponderExcluirObrigado Carlos! Foi uma honra! Pode contar comigo no que precisar, caro amigo e guerreiro! Grande abraço!
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