quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Caminhos e descaminhos

Em São Vicente eram morros, trilhas, praias desertas. Em Bertioga era mangue e beira de rio. Morro dos Barbosas, Zé Menino, Ilha Porchat, trilha do Japuí, Prainha, Porto das naus, rio Itapanhaú. Horas na companhia de mosquitos, do vento, do silêncio, do horizonte, dos pássaros e das drogas. Horas lentas, mortas, infinitas, perdidas no vácuo da lassidão do tempo eterno, indiferente, fluído. Peito vazio, mente cheia, saudades, raiva, medo, impotência, tristeza acompanhavam as subidas, descidas, caminhadas. Sempre era um esforço imenso encontrar um lugar debaixo do sol longe de qualquer resquício de humanidade e civilização. Não era paz, era repulsa. Não era busca, era fuga. No meu mundo, ainda a noite por esses caminhos o único medo era o da consciência e da vida. Horas se passavam, contemplando a vida indiferente, plena e infinita. Há uma paz e segurança, uma sensação de harmonia e equidade que escapam a razão, se impõem.e bastam. Eram os dias em que me bastava ser coisa e estar no mundo. Nem homem, filho, pai, cidadão, trabalhador, intelectual, militante, poeta, transgressor, desajustado - ainda que fosse isso tudo ou quase, afirmando e negando na dialética dos desterrados. A margem da ordem dos fortes, da moral dos retos, da convicção dos crentes, da ética dos úteis, da justiça dos resignados. Perdi-me pelos descaminhos de pedras, lama, galhos, folhas, buracos, arvores. Vi sombras, luzes, reflexos, horizontes e coisa alguma que fosse da ordem da civilização. Nada procurei e me perdi porque não buscava senão não me encontrar ou refletir sobre coisa alguma. E encontrei a exata medida do quanto basta pra quem está cheio de si e das verdades do mundo.

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